Doce Espera: diário da mamãe e do bebê

[Contos de Outubro] O sacrifício por Aline Duarte

 Olá leitores!

Para fechar mais esse mês um conto meu, pode parecer tanto bizarro quanto qualquer outro, mas esse foi baseado em um "sonho" que tive, tenho minhas explicações sobre porque desse sonho em particular, que foi um fragmento de vários acontecimentos e outros pequenos sonhos sobrenaturais que tive naquela mesma noite.

O Sacrifício


Talvez você não acredite no que eu vá te contar aqui, mas eu tenho certeza de que foi real. De uns tempos para cá eu acordava entre as três e as quatro da madrugada, no início eu achei que fosse psicológico, após consultar um site de pesquisas, mas depois de um sonho comecei a achar que tinha algo a mais. Tentarei narrar para você o que eu vi e quem sabe te fazer sentir o que eu senti.

Certo dia sai do trabalho e fui direto para casa, era cedo, pois o sol não tinha se posto ainda. Era uma casa antiga, mas bem cuidada, não era exatamente a nossa casa, era como aquelas casas de filmes de terror, com a impressão de abandonada e que range com o vento.

Entrando pela porta da frente a primeira vista era o pé da escada e a porta do lavabo, do lado direito e esquerdo portas que levavam a outros cômodos como a sala de estar e a cozinha, acendi a luz e passei pela porta da esquerda que era onde eu estava agora, na cozinha. A casa estava silenciosa e escura, o que não era de costume. Senti-me desconfortável desde o momento que pisei porta a dentro.

 — Oi mãe, oi pai. — chamei pelos meus pais, mas ninguém respondeu de imediato e com isso senti um frio na espinha, um aviso que algo estava errado.

Eu abria a fechava os armários à procura de algo para comer quando eles adentraram à cozinha sorridentes, com mais dois casais de amigos, as mulheres eram loira e bem parecidas, poderiam ser irmãs, os homens eram diferentes, um era calvo na testa, e o outro tinha bastante cabelo. Todos se vestiam elegantemente, pareciam testemunhas de Jeová, as mulheres vestiam saia e camisete e os homens calça social e camisa. Eu visualmente não os conhecia, mas sentia que fossem conhecidos ou parentes da minha mãe, os sonhos tem esse poder de distorcer coisas e pessoas da realidade. 

O clima quando cheguei já era pesado, assustador, como em filmes de suspense antes do suspense, e se tornou pior quando todos apareceram na cozinha. Tinha um ar diferente e sinistro, e eu não gostei nenhum pouco.

 — Olá filha, como foi no trabalho? — meu pai me pergunta com um sorriso, ele estava diferente, parecia entorpecido. 

Minha mãe me cumprimentou com um beijo, e disse que eles iam sair, iam visitar outros amigos, mas percebi que essa não era minha mãe, era como ela, mas era loira, outra distorção do sonho? 

Eles terminaram o que estavam fazendo e me convidaram para ir junto, não tive escolha se tratando dos meus pais, disseram algo sobre demorar, blá-blá-blá, e que não iam me deixar sozinha em casa, e mais blá-blá-blá.

Se chegar na minha casa já foi sinistro, chegar nessa outra casa foi pior. Eu me arrepiei dos pés à cabeça assim que a porta foi aberta pelo anfitrião. Não pude ver seu rosto, pois ele vestia um manto com capuz preto e seu interior roxo.

Caminhamos por um corredor estreito, e conforme eu caminhava, era como se a casa fosse escondida por magia, e a mesma ia se desfazendo aos poucos, revelando a podridão verdadeira daquela casa.

"Magia negra" uma voz dizia para mim em pensamento, isso era obra de magia negra. Eu podia ver então mãos saindo do rodapé, mãos podres que tentavam nos alcançar.

"Seus pais estão encantados" a voz tornou a dizer enquanto mais da casa era revelada, paramos de caminhar e pude reparar em outros detalhes. 

Perto do chão na parede agora era como um calabouço, e esses corpos sem vida que tentavam nos alcançar estavam como em um bueiro escuro. Agora podia ver seus rostos, sujos e faltando partes que já apodreceram e caíram, seus lábios escuros como o carvão se mexiam em um canto em uma língua indefinida, estavam entoando um feitiço, dentes lhes faltavam.

Eu estava aterrorizada demais para continuar ali, a cada segundo só aumentava meu medo, os arrepios eram claramente um sinal de que algo estava errado e eu não tinha para onde correr, então me forcei a acordar, pois sabia que era um sonho. Real o suficiente, mas era um sonho.

Eu acordei em pânico, meu coração batia mais rápido do que eu conseguia contar com os dedos na jugular. E foi quando eu o vi, ao mesmo tempo que senti a presença de mais alguém no meu quarto, claro apenas pela luz do poste barrado pela cortina corta luz florido, era suficiente para ver o vulto em pé me observando, com fúria, eu podia sentir exalando direto para mim.

Pensei ser algo da minha cabeça, tinha acabado de acordar de um pesadelo que claramente tinha me alterado fisicamente fora do sonho. "Foi real" eu repetia para mim e isso só me fazia sentir pior e com mais medo.

Com muito custo eu adormeci novamente, mas não entrei em uma escuridão tranquila até o despertar, nem um sonho fantástico qualquer, de longe foi isso. Eu voltei exatamente onde eu parei no sonho anterior.

Estávamos todos na sala de estar, a luz das velas bruxuleavam por todo o lugar, o ar estava cada vez mais pesado, frio e me deixava enojada. No centro da sala estava a dona da casa, ela estava dentro de um círculo de sangue com velas, ossos e mais alguns objetos que pretendo não descobrir o que são. 

As paredes vermelhas pareciam verter sangue, o chão parecia gosmento cada vez que alternava os pés no chão. Um homem mexia uma colher de pau em um caldeirão na brasa, nos fundos da sala, emitia uma fumaça espessa de cor negra e cheiro forte que preenchia a sala. O restante deu as mãos dentro do círculo de sal, ao redor da bruxa anfitriã. Por algum motivo eu fiquei parada ali na porta onde eu voltei no sonho e não sai mais, como se tivesse uma barreira e eu não pudesse entrar no recinto.

O cântico ficou mais intenso nesse momento, podia sentir o cheiro da maldade no ar. De repente a chama das velas ficaram mais altas, e o cântico cessou em um silêncio ensurdecedor, tinha mais alguém ali e não era um ser vivo.

 — Oh nosso poderoso deus, obrigada pela sua presença — a bruxa disse e o restante agradeceu, ainda de mãos dadas.

Eu precisei parar diversas vezes enquanto escrevia esse relato, para perceber o quão negro eram essas intenções, me deram muito medo só de lembrar e reviver.

Foi quando percebi mais alguém comigo naquela sala, no canto esquerdo, fora desse círculo de horrores. Por incrível que pareça, eu me senti aliviada por ver aquele rosto angelical em meio ao capuz, negro também, ela tentava se camuflar, mas claramente não fazia parte desse mundo sombrio.

 — Ei, psiu — tentei chamar sua atenção, já que não podia caminhar até ela e muito menos chamar a atenção desse deus que me dava calafrios. Mas fui interrompida quando a bruxa disse algo que fez todos voltarem a atenção à mim.

 — Venha até mim criança, não tenha medo — a bruxa me chamou, e os seus servos abriram caminho para eu entrar no círculo, eu simplesmente não tinha controle sobre nada em meu corpo, apenas caminhei.

"Você é o sacrifício", a voz falou novamente, e com essas palavras ela teve minha atenção totalmente.

Meu coração batia forte em meus ouvidos, minhas mãos e pés suavam, o suor vertia da minha cabeça, o medo de morrer estava estampado na minha testa, o que fez a bruxa sorrir.

Tentei parar os passos, mas o que consegui foi apenas diminuir antes de chegar perto da barreira de sal. Olhei para trás onde estava aquela moça, quem sabe daqui conseguisse ver o seu rosto e pedir ajuda, mas ela não estava mais lá. Um misto de decepção e medo percorreu como um raio pelo meu corpo. 

Sem a quem recorrer eu comecei a rezar, talvez tivesse alguém me ouvindo, ou apenas um único conforto em meus últimos minutos de vida.

Os casais antes felizes e sorridentes, agora estavam carrancudos e vestido com capuzes pretos também, claramente não eram as mesmas pessoas, estavam possuídos.

Eu entrei no círculo contra minha vontade, e o círculo foi fechado, o casal que tinha soltado as mãos para eu entrar, agora fechou novamente, e na mesma hora a chama das velas ficaram altas, e outro cântico foi iniciado em uníssono novamente. Enquanto isso a bruxa encantava um punhal antigo, esse seria o objeto que me tiraria a vida então?

 — Posso sentir o cheiro do seu medo criança, o seu pavor brilha em seus olhos, — a bruxa revelou sua face das sombras do capuz, e pude reparar na sua pele enrugada, agora perto o suficiente para sentir seu cheiro podre — mas fica tranquila, não vai doer nadinha.

Ela me colocou de frente para ela enquanto preparava o altar do sacrifício: eu. Ela levantou o punhal enquanto murmura alguma coisa, o deus ao seu lado lambeu os beiços, mas não acredito que os servos ao nosso redor possam ver ele, ao menos não o encaram.

Ele poderia ser o próprio diabo, abaixo do tronco era corpo de bode, do tronco para cima era humano, exceto sua cabeça que claramente era do animal, seu rosto também era humano. Seu olhar era de desejo enquanto encarava o punhal acima da cabeça da bruxa que desceu na minha direção.

A lâmina acertou embaixo do meu coração, eu senti quando ela entrou na minha carne brigando com minhas costelas, depois senti o ar me faltar, perdi as forças me ajoelhando aos pés da bruxa, ela me segurava enquanto meu sangue jorrava dentro de um cálice.

Quando meu líquido rubro foi o suficiente ela me soltou agonizando em dor, quando senti o chão gelado bater embaixo de mim. Eu tentava ver o que acontecia ao meu redor, mas era difícil respirar, eu lutava, mas era difícil, ver estava ficando cada vez mais difícil também, com a minha visão ficando turva e escura. Até que tudo ficou escuro e silencioso.

Eu despertei aos poucos, como se a vida e os movimentos voltassem devagar ao meu corpo e quando a paralisia do sono saiu por completo eu pude perceber que meu coração batia tão rápido que descompassava sozinho, e uma lágrima de alívio escorreu solitária pelo canto do meu rosto. Eu estava banhada em suor, a madrugada fora fria e para isso acontecer seria praticamente impossível em condições normais, mais um sinal de que não era apenas um maldito sonho.

Aline Duarte, nasceu no final da primavera do ano de 1992, na capital catarinense, no sul do Brasil. Em 2015, publicou solo e independente Segredos- Todos Temos Um. Em 2017, publicou antologia de contos Sem mais, o amor, pela Andross Editora, e antologia de poesias A Viagem do Pólen da Vida, em parceria com o Professor Lenilson e Editora Perse. E em breve lançará sua primeira quadrilogia Coração de Oceano, livro um.

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Comentários

  1. Respostas
    1. Vish amigo, vai precisar muito mais do que isso para se proteger das forças do mal. Abraço!

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